Oficiais-generais mais jovens
Roberto Lopes
Jornalista especializado em assuntos militares.
Em 2000 graduou-se em Gestão e Planejamento de Defesa
no Colégio de Estudos de Defesa Hemisférica da
Universidade de Defesa Nacional
dos Estados Unidos, em Washington (Fort Leslie F. McNair).
É também pesquisador associado ao Laboratório de Estudos da Etnicidade,
Racismo e Discriminação da Universidade de São Paulo.
Autor de vários livros, em maio de 2001 publicou a monografia
“Oportunidade para Civis na Condução dos Assuntos da Defesa Nacional:
o Caso do Brasil”.
O aumento das operações conjuntas das Forças Armadas na Amazônia e na faixa de fronteiras brasileira e, sobretudo, o crescente empenho de forças nacionais em missões expedicionárias a serviço das Nações Unidas, recomendam a indicação de oficiais mais jovens – de vigor físico naturalmente maior – para assumirem as responsabilidades do comando.
Mas essa constatação colide com a realidade da carreira das Armas no Brasil.
Temos oficiais-generais numa faixa etária mais avançada do que seria aconselhável – e alguns com problemas significativos de manutenção da forma.
Várias décadas atrás, o Exército brasileiro recorreu à equação que fixou a permanência de um oficial no generalato em, no máximo, 12 anos (quatro para cada uma das três patentes de general), com passagem compulsória do militar para a reserva aos 65 anos.
Na Força Terrestre – que possui o número mais elevado de oficiais-generais (149) – o coronel ascende à patente de general-de-brigada, normalmente, aos 53 anos (completos ou incompletos).
Seria mais indicado que tanto no Exército como na tropa de Fuzileiros Navais, pudéssemos ter combatentes de duas estrelas (generais-de-brigada e contra-almirantes) com 50 anos de idade ou até um pouco menos do que isso.
Uma classificação das faixas etárias para atividade física e esportiva (classificação WINTER/1977) esclarece que, aos 46 anos – idade em que um oficial do Exército brasileiro normalmente é promovido ao posto de coronel –, já é clara a diminuição do desempenho do corpo, principalmente no aspecto coordenação. Itens como velocidade e resistência também mostram depauperação. A força ainda se preserva, mas apenas no indivíduo treinado é possível observar certa conservação dos valores essenciais ao esforço físico.
A Medicina Ortomolecular não deixa margem a dúvidas: aos 50 anos os músculos que movimentam os pulmões do ser humano só permitem um volume de inspiração da ordem de 4,2 litros de ar (contra 5,6 litros aos 30 anos de idade), e a massa muscular das mãos suportam apenas 34 quilos de peso (contra 37 quilos aos 30 anos de idade). O homem de 50 tem uma perda de capacidade auditiva da ordem de 20% em relação ao de 30, e, em situação de repouso, seu coração não bombeia mais do que três litros de sangue por minuto pelo organismo – enquanto o coração de um homem sadio, de 30 anos de idade, espalha, a cada 60 segundos, 3,4 litros de sangue pelo corpo.
A antecipação do auge da carreira militar poderia ser facilmente obtida pela redução das etapas do oficialato nas patentes de capitão e de coronel – as mais longas da vida na caserna. E o aceleramento das promoções também produziria outro efeito benéfico: o acesso do oficial, com mais rapidez, aos patamares mais bem remunerados da hierarquia.
A opção de formar oficiais-generais com mais celeridade, aproveitando melhor o vigor físico dessas lideranças, já não é novidade em vários exércitos do mundo. A carreira do almirante americano Sam Locklear é exemplo disso.
Oficial-general de quatro estrelas – penúltimo grau da oficialidade naval em seu país –, Samuel J. Locklear III, chefe do Comando dos Estados Unidos no Pacífico, sediado no Havaí (uma das mais importantes estruturas de combate americana), completou, em outubro passado, o seu 59º aniversário.
Enquanto Sam Locklear alcançou a nomeação para a chefia das forças estadunidenses no Oceano Pacífico após 36 anos de formado na Academia Naval de Anápolis, no Brasil o novo chefe do Estado-Maior da Armada, almirante Carlos Augusto de Souza, precisou de 40 para atingir a patente de almirante-de-esquadra, a mais alta de sua profissão. Na Marinha brasileira um oficial com 36 anos de formado seria, quando muito, vice-almirante.
O caso do General aviador de quatro estrelas Gilmary Michael Mike Hostage, de 58 anos, atual chefe do Comando de Combate da Força Aérea americana é ainda mais impressionante.
Declarado 2º Tenente a 7 de setembro de 1977, ele alcançou o generalato no primeiro dia de 2002, aos 47 anos incompletos, e a quarta estrela em setembro de 2011, aos 56, após completar 34 anos de serviço. Na Força Aérea Brasileira, um oficial com 34 anos de carreira não seria mais do que brigadeiro-do-ar antigo ou major-brigadeiro recém-promovido.
No US Marine Corps, o famoso Corpo de Fuzileiros dos EUA, um oficial combatente também pode alcançar a patente inicial do generalato – brigadeiro-general, de uma estrela – aos 46 ou 47 anos de idade. Em situações extraordinárias, criadas por promoções por extremo merecimento, até antes disso.
Na França, generais e almirantes chegam ao comando de forças operacionais importantes no patamar dos 50 anos, e na Espanha, uma equipe de nove parlamentares instalada mês passado no Ministério da Defesa – em um órgão intitulado “Observatório da Vida Militar” – vai analisar a conveniência de suas Forças Armadas conferirem mais peso ao critério da resistência física para as promoções ao generalato, bem como avaliar a necessidade de uma reforma na carreira, objetivando a incorporação de generais combatentes mais bem dispostos.
Até o pequeno Exército do Uruguai (15.000 homens), onde o militar costuma (ou costumava) alcançar o generalato após ter completado 54 anos – nele permanecendo pelo prazo máximo de oito anos –, decidiu experimentar um arejamento do seu grupo de 16 generais.
Neste 1º de fevereiro de 2014, a corporação uruguaia implementou uma renovação qualificada pelo governo de “histórica”: seis coronéis com idades entre 51 e 54 anos (dois de Cavalaria, dois de Engenharia, um de Infantaria e um de Comunicações) estão sendo promovidos a general.
Na verdade, a própria escolha feita pelo presidente uruguaio Pepe Mujica (ainda no fim do ano passado) do oficial que comandará o Exército a partir deste mês de fevereiro já sinalizava para a tendência da corporação pelo rejuvenescimento dos seus quadros de mando.
Juan A. Villagrán, um militar da Cavalaria, nasceu a 23 de fevereiro de 1954, e em 2007, aos 53 anos incompletos, foi nomeado general. Ex-Adido Militar em Madri, ele chefiou o Departamento de Inteligência Nacional e, mais recentemente, comandava a 3ª Divisão do Exército. Agora, aos 59 anos, ocupará o cargo máximo de sua Instituição Militar.
No Brasil, aos 59 anos, um militar que alcançou o generalato não passa de general-de-divisão (e assim mesmo, relativamente moderno no posto).